Essa é a história de um menino que um dia viu um gigante e acreditou que podia ser igual a ele. E foi. Pelo menos naquele instante mágico da brincadeira ele foi.
Background
Corria o ano de 1986, minha irmã mais nova tinha acabado de nascer, e começou a correr lá em casa uma conversa de que a família se mudaria para o sertão alagoano. Sou mineiro, zona da mata, Cataguases mais precisamente. Porém, eu estava perto de fazer 8 anos e não tinha a mínima ideia do que era exatamente o sertão.
Nós estávamos indo para Delmiro Gouveia (AL) porque meu pai seria responsável por projetar o museu da “maria-fumaça” naquela cidade, e mais, restaurar uma locomotiva que estava no fundo do rio São Francisco.
Janeiro de 1987 e lá fomos nós. Primeira viagem de avião e as pernas tremiam. Entretanto, valia pela experiência e foi até divertido. Chegamos a Maceió e já pegamos um carro para nos levar até Delmiro.
O sertão é o lugar mais inesquecível na minha vida. Minha maior escola! Não tenho dúvidas de que 80% do que sou devo ao meu tempo em Delmiro Gouveia.
A NBA
Morávamos em uma casa grande e que tinha um quintalzão, chão batido, quase um Maracanã. Dava para brincar muito ali! Futebol, pique, subir nas árvores, colher frutas. Claro que a brincadeira principal era bater uma bolinha. Meu irmão e eu nos refestelávamos naquele paraíso.
Acontece, entretanto, que em 1987 rolou a vitória do Brasil sobre os EUA nos Jogos pan-americanos de Indianápolis e foi aquele azougue. Todo mundo falando de Oscar, Marcel, Pipoka, Guerrinha. Claro que eu conhecia o basquete, ou melhor, sabia o que era o jogo, mas nunca tinha parado para jogar.
E esse sucesso do ouro do Pan coincidiu com o início das transmissões da NBA na TV Bandeirantes (ainda não era a Band). Engraçado que na época Luciano do Valle e Álvaro José chamavam a NBA de Campeonato Norte-americano de Basquete.
Com um certo atraso
Detalhe, a TV Bandeirantes transmitiu as finais de 1986 em VT a partir do jogo 3, já com mais de um ano de atraso. Mas foi legal ver alguns daqueles jogos. As finais foram disputadas entre Celtics e Rockets. Era fácil perceber que aqueles caras gigantescos jogavam algo para além do basquete. Olajuwon de um lado e Larry Bird do outro, mas meu coração ainda não tinha batido forte por nenhum deles.
Paixão à primeira vista
Foi então que um belo dia a Band passou um jogo dos Lakers. E para que jogador meu olhar foi instantaneamente atraído? Magic Johnson? Nããããããããããooooo!!! O “cara” para aquele moleque de 8 anos era Kareem Abdul-Jabbar.
Era impossível ver aquele ser mitológico de 2,17m, careca, jogando de óculos e não se mesmerizar. Os óculos… aquilo era o que mais me chamava a atenção. Ficava me perguntando: será que não machuca? E se ele tomar uma bolada?
Mas foi essa figura exótica que me fez me apaixonar pelos Lakers e começar a seguir a NBA. Kareem foi tão influente na minha vida que por conta dele resolvi torcer por todos os times de Los Angeles (Dodgers, Kings e Rams, mais recentemente). Falei sobre isso aqui.
O gancho
Mas se em um primeiro momento a excentricidade foi o ímã, depois percebi o “gancho”. Ah, o “gancho”!!! O que era aquilo!!! Corpo posicionado lateralmente à tabela, um arco longo com o braço direito e a precisão milimétrica para fazer com que a bola fosse sugada pela cesta.
Foi aí que aquele quintalzão (quase um Maracanã) foi transformado no Madison Square Garden. Pedi ao meu pai que conseguisse um pneu. Ele cortou o pneu em duas bandas que se transformaram em aros. Arrumamos uma geringonça para sustentar os “aros”. E os dois irmãos que se sentiam Maradona e Careca agora eram Kareem (eu) e Magic (meu irmão).
Além das disputas mano-a-mano com meu irmão mais velho (5 anos a mais) eu passava boa parte do meu tempo reproduzindo o “gancho”. Eu me sentia o próprio Kareem. Arrumei uns óculos e minha mãe não permitiu que eu ficasse careca. Queria ser ELE!!!
Como eu tinha a mais translúcida certeza de que eu era aquele gigante e o quanto, até hoje, ele continua tendo lugar cativo e decisivo no meu amor pelo esporte, pelo basquete e pelos Lakers.
Ah, Kareem…