Sabrina Ionescu e uma reflexão sobre a WNBA

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Depois de coisas que parecem puro marketing, como ser a 1ª jogadora de basquete a ter uma linha de tênis unissex com a Nike e ser escolhida para a capa especial do NBA2K24, Sabrina Ionescu de fato colocou seu nome nos livros da histórica do basquete americano. Ontem na primeira noite do WNBA All-Star, durante os torneios de habilidade do All-Star Game da WNBA ela quebrou um recorde da WNBA, e até da NBA!

Em um incrível desempenho, acertou 25 arremessos de três pontos dos 27 possíveis! Ao todo foram 37 pontos, sendo que as regras de pontuação são as mesmas da NBA. 5 racks com 5 bolas, onde 1 rack tem 5 bolas valendo 2 pontos e 4 racks com 4 bolas valendo 1 ponto e 1 bola valendo 2 pontos. Além desses racks, também temos as 2 bolas que ficam um pouco mais distantes e valem 3 pontos.

Recordista entre ligas

Então, em apenas 70 segundos, Sabrina Ionescu fez algo que nunca tinha sido visto na história das ligas de basquete americanas. Até ontem, o recorde na NBA era de ninguém menos que Stephen Curry. Ele mesmo, aquele que provavelmente é o melhor shooter da história da liga, quiçá do esporte. Foram 31 pontos em 2021, no All-Star Game em Atlanta. No começo desse ano, Tyrese Haliburton igualou a marca no All-Star Game em Salt Lake City.

Já na WNBA, o recorde anterior era de 30 pontos, estabelecido no ano passado por Allie Quigley. Pra deixar ainda mais bonito e roteirizado, Sabrina ganhou o torneio de 3 pontos logo após perder o torneio de habilidades. Enfim, o hype é grande e fica muito difícil não falar da grandiosidade de Sabrina Ionescu. Mas o texto que vem a seguir, usa Ionescu apenas como uma introdução. Precisamos falarmos de algo que, de certa forma, anda entalado na garganta de muitos.

Os números da WNBA em 2022

Ao longo dos últimos anos, a WNBA tem experimentado um notável crescimento. Tanto no interesse do público, como mostram os números que trarei a seguir, quanto de exposição midiática. Na última temporada (2022), a liga registrou um novo marco de engajamento por todas as suas redes sociais. Na TV, somando os 4 canais que transmitem os jogos nos Estados Unidos (ABC, CBS, ESPN, e ESPN2), foi a maior média de televisores ligados dos últimos 14 anos.

Um aumento de 16% em relação à temporada regular de 2021, com média de 379.000 espectadores. O All-Star Game de 2022 tornou-se o All-Star Game mais visto em 6 anos. Com média de 734.000 espectadores, 53% a mais do que o ano de 2021. Já o Draft de 2022, teve uma média de 403.000 espectadores na ESPN. Isso representa um aumento de 20% em relação a 2021, tornando-se o Draft da WNBA mais assistido desde 2004.

O crescimento contínuo da WNBA

Em 2023 os números ainda não são absolutos, mas já conseguimos enxergar mais crescimento. O Draft desse ano teve 572.000 espectadores, ou seja, algo em torno de 42% a mais que 2022. Mas não para por aí, o jogo entre Phoenix Mercury e Los Angeles Sparks, tornou-se o jogo da temporada regular da WNBA mais visto na TV a cabo em 24 anos e o jogo da noite de abertura da WNBA mais visto nas plataformas da ESPN em 11 anos!

Bem, a transmissão do jogo começou às 23:00, não do Brasil, mas de Nova Iorque! O que só mostra o potencial, ou seja, como espaços na grade de transmissão em horário nobre podem trazer mais audiência ainda. A audiência média foi de 683.000, com um pico de 1 milhão de espectadores. Um crescimento de 103% comparado a temporada de 2022. Bom, o retorno de Brittney Griner à WNBA, impulsionou os números? Sim, mas eles seguem impressionando.

Público nos ginásios

Enfim, os números da TV em 2023 ainda serão revelados e ainda precisamos avaliar. Também existe um ponto que precisa ser levado em conta ao analisar os números, nessa temporada as franquias jogarão um total de 40 jogos cada. É o maior número de jogos na história da liga. Mas já é percebido o crescimento do interesse do público, ainda mais quando analisamos os números de público nos ginásios, os números abaixo são divulgados semanalmente e peguei o que saiu mais recente, no começo de julho.

A tabela mostra o crescimento de público nos ginásios para jogos da WNBA.
Fonte: beyondwomenssports.com

Na semana de 26/06 a 02/07, foram 17 jogos no total, o maior público da semana foi em Las Vegas, em 29 de junho com 9.587 torcedores no ginásio. Em Atlanta, o Atlanta Dream teve todos os ingressos vendidos nos dias 30 de junho e 2 de julho. Pensando num geral, a média de público nos ginásios da liga aumentou em torno de 16%. A tabela acima traz a comparação de cada franquia com o ano passado.

Vale lembrar, que muitas das franquias da WNBA estão vinculadas a um time da NBA, então acabam jogando no mesmo ginásio. No entanto, algumas acabam jogando com setores fechados e só abrem em caso de muitos mais ingressos vendidos. No jogo de abertura da temporada, que citamos mais acima, a Crypto.com Arena recebeu 10.396 pessoas e teve muitos nomes conhecidos como, Magic Johnson, Billie Jean King e a vice presidente dos EUA, Kamala Harris.

O que causou o crescimento?

Uma das principais razões para esse crescimento está muito ligada a nova safra de talentosas jogadoras que têm se destacado na WNBA. Breanna Stewart, A’ja Wilson, Kelsey Mitchell e a própria Sabrina Ionescu, têm impressionado com suas habilidades e se tornaram ícones do esporte. Mais do que isso, Breanna, A’ja e Sabrina, também surgem como grandes vozes de questões sociais importantes, usando sua plataforma para promover mudanças significativas.

Outro motivo, que mesmo que ainda tenha problemas, pode ser considerado um motivo para o crescimento da liga é o último acordo trabalhista assinado em 2020. Esse acordo trabalhista garantiu um aumento de salário médio anual para as jogadoras, quase dobrando o valor anterior ($ 117.500 para $ 215.00) e também registra um marco importante para o bem estar das jogadoras, como direitos a licença-maternidade, assistência médica e melhores condições de viagem.

O acordo de trabalho de 2020

Em todos os aspectos, esse acordo busca criar um ambiente mais favorável para as jogadoras. Mesmo que ainda existam críticas, como a que abordarei em seguida, demonstra o compromisso da WNBA em investir em suas jogadoras e criar condições de trabalho mais justas e equitativas. Enfim, vamos a uma crítica a esse CBA e que já pode impactar no próximo ano. Um desafio contínuo para a WNBA é que algumas jogadores jogam em dois times.

Pois é, como os salários da WNBA são bem modestos, muitas jogadoras também jogam em times fora dos Estados Unidos, seja na Ásia ou na Europa. Isso gera problemas para a liga, até mesmo com jogadoras que acabam se lesionando na temporada da liga estrangeira. Sendo assim, o acordo de 2020, criou uma política que até 2024, jogadores com mais de 3 anos de experiência na WNBA serão obrigados a jogar toda a temporada da WNBA.

Em caso das jogadoras deixarem de se reportar à franquia da WNBA porque estão jogando em outra liga, serão considerados inelegíveis por toda a temporada da WNBA, com isso, perderão seu salário. Jogadoras com menos de 3 anos de experiência na WNBA, ou que tem uma renda baixa, estarão isentas desta política. Mas será importante observar se isso deve impactar no interesse em jogar na liga. Teremos evasão de talentos?

Enfim, mudanças estão acontecendo, a liga vem crescendo, mas esse dinheiro precisa chegar em quem é a causa raíz desse crescimento; as jogadoras da liga. Porém, por mais parceiro que eu seja dessa luta, temos que colocar o pé no chão, e analisar o contexto do mundo em que vivemos. Todo investimento é feito pensando em um retorno. No momento os números são excelentes, mas o quanto isso se tornará efetivamente lucrativo?

Oportunidades

A perspectiva é boa e agora talvez seja a hora da WNBA aproveitar o engajamento do público, as estrelas em ascensão, como Sabrina Ionescu e arregaçar as mangas. Começando por buscar investimento em marketing e aproximar a liga das comunidades locais. Seja via clínicas de basquete, eventos comunitários e até programas de desenvolvimento em escolas. Ao construir uma base sólida de fãs desde a infância, a WNBA estará garantindo um público cativo no futuro (bem diferente do que Rob Manfred tem feito com a MLB).

Parcerias estratégicas com empresas que tenham interesse em apoiar e promover o esporte feminino, mesmo que a gente saiba que no fundo é só aproveitar a onda para mostrar o quanto é cool. Essas parcerias podem trazer investimentos financeiros, oportunidades de patrocínio e acesso a recursos que ajudem no crescimento da liga. Outra possibilidade é ir na direção contrário ao ponto do acordo coletivo que citei mais acima.

Não “brigar” com jogadoras e com ligas estrangeiras, mas de fato colocar o pé numa expansão internacional. Quem sabe promovendo jogos ou até criando um evento entre as ligas. Assim como a NBA fez nos anos 90 e foi muito bem comprovado, atrair uma base de fãs global é aumentar receitas, seja por direitos de transmissão e/ou vendas de mercadorias. Por fim, pra fechar essas dicas que nunca serão lidas pela WNBA, é momento de aproveitar o crescimento de transmissão na TV e em 2025, na renovação com a ESPN, usar o mesmo negociador que outras ligas usaram, colocando o Mickey contra a parede!

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