Bem vindos “au, au”migos para a apresentação da mascote da semana. Hoje retomaremos a série das mascotes olímpicos. Como já havia dito no fim da coluna passada sobre CoBi, a mascote de Barcelona 1992, depois dela os diversos organizadores se perderam tentando trazer “conceitos inovadores” na criação das mascotes por duas décadas.
A dupla de mascotes que quebrou a má sequência foi Wenlock e Mandeville, mascotes de Londres 2012. Eles serão os personagens da coluna de hoje.
Mudanças na concepção
Talvez o principal fato que ajudou a volta das mascotes à ribalta tenha sido justamente a mudança no plano de marketing dos Jogos Olímpicos. Desde Sydney 2000, a tentativa inicial foi de criar várias mascotes para vender mais souvenires e aumentar o poder de escolha dos clientes. Porém o único resultado foi a perda completa do interesse nas mascotes.
Então, para Londres 2012, o Comitê Olímpico Internacional (COI) decidiu mudar os planos. A partir de então haveria apenas uma dupla de mascotes: a primeira seria apenas a mascote dos Jogos Olímpicos e a segunda, dos Jogos Paralímpicos.
Dessa forma, os direitos de cada uma pertenceriam exclusivamente ao COI e ao Comitê Paralímpico Internacional (CPI), separadamente. Porém as duas mascotes deveriam ser criadas em conjunto dentro de um mesmo projeto maior de divulgação conjunta da edição dos Jogos Olímpico e Paralímpico.
Dessa forma, um concurso foi aberto pelo Comitê Organizador dos Jogos de Londres 2012 (LOCOG) para a recepção de ideias para a dupla de mascotes e o mesmo foi aberto para qualquer empresa que cumprisse certos requisitos do edital e mais de 100 participantes enviaram seus projetos.
Origem
Ao fim, o Comitê escolheu o projeto da famosa agência de criação londrina Iris. Ela criou dois mascotes que ficam no meio do caminho entre humanos e robôs. Pela história inventada, elas surgiram de duas gotas de aço fundido usado para fazer a última viga do Estádio Olímpico de Londres. Logo após terem escapado da linha de produção da siderúrgica, eles ganharam vida quando um arco-íris terminou exatamente em cima delas.
Como lascas de metal originaram as mascotes, aço altamente polido compõe sua pele e podem refletir o que encontram. Assim, o desenho das mascotes poderia ser feito com diferentes pinturas, dependendo da situação. Eles também não têm um olho, mas uma câmera para ver e gravar os Jogos Olímpicos. E o toque londrino nas mascotes fica na luz amarela da parte de cima da cabeça, igual a de um táxi da cidade.
Segundo Grant Hunter, diretor criativo da agência, o conceito foi criar mascotes simplificados e aerodinâmicos, mas que ao mesmo tempo representassem a herança cultural de Londres, do Reino Unido e dos movimentos olímpico e paralímpico. Além disso tudo, o design também deveria ser facilmente customizado em relação a coloração.
Mandeville acabou também tendo a influência da aerodinâmica de carros esportivos. Já Wenlock teve sua testa desenhada de acordo com as curvas da arquitetura do Estádio Olímpico. Além disso, os triângulos foram postos de forma a reproduzir as 3 posições de um pódio olímpico.
Wenlock ficou como mascote dos Jogos Olímpicos e Mandeville, dos Paralímpicos. Por isso, aquele usa as pulseiras da amizade nas mãos representando os anéis olímpicos, enquanto esta traz em sua cabeça os três agitos, símbolo do CPI.
Nomes
Seus nomes também carregam forte simbolismo. Wenlock recebeu esse nome em homenagem a cidade de mesmo nome. Nela, no meio do século XIX, a sociedade olímpica de Wenlock criou um proto-evento esportivo. Este evento é que teria inspirado o Barão de Coubertin a recriar os Jogos Olímpicos em 1896.
Por sua vez, Mandeville é uma homenagem ao Hospital de Stock Mandeville. Este organizou em 1948 a 1ª edição dos Jogos Mundiais para cadeirantes e amputados. Desta competição anual que surgiu a partir de 1960 os Jogos Paralímpicos, motivo pelo qual a cidade de Stock Mandeville é conhecida até hoje como berço dos Jogos Paralímpicos.
Recepção do Público
O LOCOG revelou as mascotes em 19 de maio 2010, pouco mais de 2 anos antes dos Jogos Olímpicos. Logo após a apresentação, eles foram recebidos de forma altamente crítica pela mídia e público britânicos, especialmente por causa da ideia inédita de criar mascotes de sobras de metal fundido que criou duas mascotes que mais parecem a descrição do ciclope, o monstro da mitologia grega.
O Comitê organizador defendeu que a intenção ao criar as mascotes era atingir jovens de 5 a 15 anos, não adultos. Aliás, as pesquisas com grupos de foco sugeriam as mascotes agradavam bastantes a elas, que não carregam os conceitos preconcebidos dos adultos.
Sucesso com os Jovens
O tempo deu razão ao Comitê Organizador. Por mais que ambos continuassem a ser incessantemente ridicularizados pela imprensa e pelos fãs olímpicos como um todo, entre as crianças sua popularidade cresceu rapidamente, em níveis não atingidos pelos Jogos Olímpicos há tempos.
Para ajudar na divulgação, o LOCOG criou 4 curtas-metragens animados com as mascotes, apresentados tanto na BBC TV como nos cinemas britânicos. Abaixo está o primeiro destes episódios.
Então, aproveitando o sucesso com os pequenos, o LOCOG criou uma equipe de animadores infantis vestidos com a caracterização das mascotes para visitar escolas por todo o Reino Unido. Apesar do preço salgado de 850 libras, podendo chegar a 2500 libras se apresentação fosse em escolas da Escócia ou da Irlanda do Norte, a agenda dessas apresentações rapidamente lotou.
Em virtude do preço cobrado, o LOCOG recebeu fortes críticas. Apenas as escolas de alunos mais abastados podiam receber a visita das mascotes, perdendo de vista a inclusão social.
Legado
Wenlock e Mandeville tiveram o legado de trazer o trem da criação de mascotes olímpicos de volta aos trilhos, já que estava descarrilhado desde 1996, e o sucesso deles mostrou que menos é mais. Ou seja, é mais importante ter apenas uma ou duas mascotes de “mesma origem”, que conquistem verdadeiramente o público, do que ter várias mascotes diferentes.
Assim, as mascotes de Londres 2012 puderam ter um destaque durante os Jogos e abriu as portas para a grande volta das mascotes olímpicas ao palco principal do marketing dos Jogos Olímpicos 4 anos depois. Até hoje, as contas de Twitter deles estão ativas, mesmo que sem novas postagens desde o fim de 2018. O leitor poderá segui-los em @iamwenlock e @iammandeville.
Porém faltou cortar uma última amarra desses 20 anos de ostracismo: assim como os quase todos seus antecessores desde 1996, as mascotes ainda eram totalmente abstratas e isso limitou o sucesso entre os adultos. Essa amarra só seria quebrada 4 anos depois, usando o tempero de um lugar bem conhecido de vocês todos.
Por um acaso, o mesmo lugar de onde acharam meu nome. Mas isso será assunto para a próxima coluna, a última desta série de mascotes olímpicas.
Obs: não sabem o porquê que me chamo Baleia? Estudem a literatura brasileira.